Manoel Salvador Pessanha.
Campista com muito orgulho.
Quando conheci meu sogro ele já havia se instalado aqui em São Gonçalo, "fugindo" do rio que ele aprendeu a respeitar desde que nasceu e cresceu ao seu lado, em Guarús.
Um dia, o mesmo rio que o viu crescer e prosperar como um forte comerciante e respeitado homem, tirou dele tudo que havia construído com muito trabalho.
Perdeu muito dinheiro, deixou seus carrões, motos e caminhões, sua boa casa e seu conforto, sua fonte de renda carregada pela força das águas na enchente do rio Paraíba.
O rio carregou também a sua alegria e a decepção foi tão grande que resolveu sair da cidade que tanto amou.
O baixinho de cor da pele característica e olhos claros me contava se feitos pelas noites de de sua cidade, nas boates, nas festas, nas praias. Cercado de amigos, era tido como farrista, respeitado por sua bravura e boa influência na cidade.
De caráter forte, muito conservador e detalhista, adorava nos últimos anos fazer obras, modificar e reformar suas casas. Um "cavalo" para trabalhar desde os tempos que dirigia seu GMC marítimo (como gostava de referir) de Campos (carregado com açúcar) para o Rio (voltava com fardos de carne seca e tinha que colocar um homem armado em cima da carga na serra para não ser roubado) por estradas da época.
Imaginava como um baixinho daquele podia dominar um bruto desses... |
Dono de muitas histórias de farra que são ainda rememoradas por sobrinhos e amigos, o Manelzinho que era revoltado com a vida que lhe tirou uma condição rica e o fez ser empregado simples em uma empresa fora de seus domínios.
Também não se arrependia de ter deixado para trás os seus devedores clientes que, como ele, também perderam muito na época de cheia.
São muitos casos, muitas lembranças, boas risadas, amigos, cumpadres, parentes. Todos por ele respeitados, ajudados, abraçados em seu coração e sua direção dura e justa.
Na formatura da filha mais nova... |
Numa hora que muito gostava: na mesa para usurfruir de sua fartura, comer e beber bem. |
Nos últimos anos, lutou muito contra uma doença que já havia se instalado.
Em sua valentia, a esperança de que sairia dessa nunca lhe foi admoestada. Sua crença em poder voltar a ser o que era, fazer o que gostava, era seu incentivo próprio.
Sofreu muito ao ver suas forças serem minadas pela inimiga e não conseguir mais superar como fez em longos 5 anos.
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Cada prato de comida que comia era um motivo de alegria para todos... |
O homem bravo que todos temiam se mostrou mais forte que tudo e encarou até o último suspiro aquela que lhe venceu neste domingo que passou.
Sem músculos que lhe sustentassem pernas e braços, sem sua visão e audição para reconhecer quem lhe chegava, ainda fazia ser presente suas vontades, suas memórias, invadidas e destruídas aos poucos... Era difícil para mim vê-lo assim. Era difícil beijar sua testa como fazia até poucos dias.
"Tá pensando que barba de gato é sabonete????"
"Ou cê não entendeu???"
"Oche!! Oche!!???"
"Vambora bahiano!!!"
"Iiiihhhh, vai dar febre de quarenta!!!"
"Bico fino, bahiano???"
"Político vem de puto..."
Nessa segunda, 11 de junho, às 10h, em meio a outros túmulos do cemitério em sua terra, eu observava as imagens de Cristo a minha volta enquanto o caixão era colocado em seu refúgio.
Lembrei que ele citava sempre a "hora da verdade" entre outros bordões próprios e pensei comigo que ali estava a hora da verdade. Alí, deixamos de ser diferentes em tudo desde que nascemos.
Somos todos iguais. Matéria e lembranças dos que ficam.
Todos seremos iguais novamente um dia. Tão difícil dia nos olhos e nas lágrimas diferentes dos que ficam...
A minha despedida é saber de quão bom foi para seus netos, meus filhos, em suas lágrimas que não podia conter.
Beijo, meu sogro.
Esteja em paz na paz do Senhor.